Criar um Site Grátis Fantástico

Parece que foi ontem...

Parece que foi ontem...

 

10 De Dezembro de 2005.

Naquela tarde de sábado a Ni e a tia Inês passaram por nossa casa.

A Teresinha já se encontrava muito doente. Sentadinha no sofá tentava manter conversa, mas as palavras saiam com dificuldade e a voz disforme.

Ao jantar comeu umas colherezinhas de água de sopa, que tive que aquecer várias vezes, devido ao tempo que demorou a engolir.

Quando finalmente acabou de comer ajudei-a a levantar-se para ir para a caminha.

Ao pôr-se em pé as suas pernas cederam. Agarrou-se ao meu braço assustada, eu segurei-a.

O pai que se encontrava na sala veio logo em seu auxílio e esperamos alguns minutos em silêncio até que se recompusesse.

O seu estado de saúde já não permitia que subisse as escadas pelo seu pé. O pai pegou na Teresinha ao colo e subiu as escadas.

 

Penso que gostaria de ter ficado assim para sempre.

 

Eu fui atrás a observa-la.

O rosto tombou sobre o ombro e costas do pai, os olhos cerraram-se.

Um derrame cerebral tinha colocado a Teresinha em coma.

 

O adeus foi ao colinho do pai.

Deitamo-la na cama com todo o cuidado,  ao tentarmos arranjá-la ela queixava-se, resolvi por isso não me deitar junto dela, como era costume.

Toda a noite gemeu, apesar da morfina que lhe administrei várias vezes.

O pai ao ouvi-la sugeria-me que lhe reforçasse as doses, mas eu tinha medo que uma overdose a matasse.

Assim passei as horas, acordada, deitada com o pai, no quarto ao lado do dela, a ouvi-la e sem saber o que fazer:

- A minha filha não pode contar mais comigo, o meu dever de mãe fracassou, o que devo fazer para lhe garantir protecção e apoio, que impotente me sinto!

- Porquê tanta luta e sofrimento em vão, que pecados fez esta pobre para sofrer desta maneira!

Pedia que o fim chegasse rápido. Não aguentava vê-la naquela agonia. Temia que pudesse acordar e tomasse consciência da gravidade da sua doença.

Como iria ela reagir? Seria eu capaz de continuar a encobrir e animá-la como o tinha feito sempre, impossível!...

 

11 De Dezembro de 2005.

Domingo pela manhã a Teresinha sossegou, mas melhoras nenhumas.

A tia Teresa chamou uma enfermeira para algalia-la e colocar soro, o que veio a acontecer apenas pelo meio da tarde.

Não vou entrar em pormenores, mas a doença tinha consumido e transfigurado a Teté.

O tio Sílvio passou por nossa casa pelo fim de tarde e quis ver a Teresinha, a tia Mina também.

Eu tentei evitar as visitas, não queria que ela percebesse que o seu fim estava próximo, temia perguntas a que eu teria dificuldade de lhe responder.

Foi também para vos poupar a vocês, familiares e amigos, não queria que ficassem com uma recordação da Teresa diferente do que ela sempre foi, uma bonita jovem, alegre e divertida.

 

12 De Dezembro de 2005

Na 2ª feira o seu estado em coma mantinha-se, por vezes tinha dúvidas se ainda respirava.

A tia Teresa emprestou-me o estetoscópio para eu tentar ouvir o seu coração, já com batimentos irregulares e pouco perceptíveis, até que  por volta das 14.00H o silêncio instalou-se de vez.

O pai foi ao armador, Sr. Bessa, tratar do funeral.

 Pedi-lhe que o caixão fosse de cor clara, o mais simples possível e revestido a chumbo.

Mais tarde ligou-me a perguntar quanto é que media a nossa filha e que não havia caixão como eu pretendia.

Como era estranha toda aquela conversa, nunca pensei passar por semelhante situação, decidir sobre o caixão para enterrar a minha única filha.

Em todos os momentos, em que me foi permitido estar presente, estive ao seu lado, nunca chorei à sua frente, as minhas palavras foram sempre de esperança por dias melhores que haviam de chegar.

Abracei e acariciei muitas vezes a Teresinha com vida e depois já sem ela. Tentei controlar o mais que pude as emoções, pois não queria ser medicada, nem privada de estar presente, queria ver e assistir a tudo, sabia que brevemente deixaria de a ter comigo para sempre.

Queria ser eu a escolher a roupa para ela vestir.

Optei por uma peça comprada por ela, uma saia em bombazine cinzenta, havia mais garantia que iria gostar. A combinar uma camisola do colégio Luso - Francês e umas meias, pelo joelho ao xadrez.

Ficava com um ar colegial, pareceu-me bem, dado os seus 17 anos e a extraordinária ligação que manteve com a escola, mesmo doente.

As tias Mina, Inês e Tuxa ajudaram a vesti-la.

Pelas 18.00H entraram em minha casa uns homens de fato. Traziam com eles um caixa um pouco escura para uma adolescente, ligeiramente trabalhada e não era revestida a chumbo. Não fiz qualquer comentário, eram pormenores sem importância comparado com tudo o que estava a viver.

Passados alguns minutos vi a dita caixa aos ombros dos homens. Lá dentro imaginei a minha filha.

Foi assim que  a Teresinha saíu de casa pela última vez.

Não existem palavras para descrever o que senti. Não sei onde se arranja força para se preparar e assistir ao enterro de um filho.

Dirigi-me ao quarto e vi que eu já estava à espera.

A cama desfeita e vazia, assim me sentia também.

Atirei-me sobre os lençóis e senti ainda o seu cheiro.

Chorei, chorei perdidamente.

 

13 De Dezembro de 2005

O que se passou na 3ª feira, lindo dia de sol de Inverno, todos vocês sabem e se lembram.

Preparamos-lhe uma despedida comovente e com a dimensão que ela bem merecia.

Na presença de muitas centenas de familiares e amigos a nossa menina foi sepultada no jazigo de familia no cemitério de Moreira da Maia pelas 17,00h.

Ninguém ficou indiferente ao seu sofrimento, ao nosso e porque não ao vosso.

 

Sem a Teresa vejo tudo em tons de cinza, nada será mais igual...